Stalker - Tarryn Fisher | Faro Editorial
É
sempre interessante ler sobre a natureza humana, suas distorções e realidades
que parecem surreais. Existe algo sobre essa dissimulação e complexidade que vicia,
intriga e choca na mesma proporção. Confesso, que quando pego uma obra assim,
minha maior vontade é de ter estudado psicologia para poder esmiuçar e compreender
mais a fundo essas ações e comportamentos que por vezes parecem “normais”, revelando
a verdade por trás disto apenas quando já é tarde demais.
Tarryn Fisher ousou. Ousou
quando escolheu escrever um livro com três pontos de vistas que narram a mesma
história, ou melhor, o mesmo momento contado através de três visões diferentes,
e tudo isso em primeira pessoa. A Psicopata, o sociopata e a escritora. Mergulhar
na cabeça destes três personagens e nos apresentar essas narrativas exige certa
coragem. O que me leva a crer que nenhum dos narradores são confiáveis,
portanto... desconfie de tudo e de todos.
“(...) As pessoas que prestam atenção aos detalhes não são tolas; é sinal de que veem de fato a gente. E isso implica um certo esforço. É preciso olhar para fora de si mesmo para enxergar os outros. Algo raro hoje em dia.”
STALKER nos apresenta
como protagonista, Fig Coxbury uma
mulher que logo de início já é diagnosticada com Transtorno de personalidade paranoide,
o que só por aí já gera um alerta bem grande sobre sua cabeça. Ela está
deprimida desde que sofreu um aborto, e tem estado completamente obcecada pela
ideia de ter uma filha desde então e por essa razão tem como hábito ficar
observando as mulheres com crianças a sua volta. Até que um belo dia, ela se
depara com Jolene e sua filha, e algo dentro dela é atraído para essas duas.
Fig as segue, e sua obsessão sobre ambas aumenta a ponto dela se mudar para a
casa ao lado e sua atenção então deixa de ser apenas sobre a menininha e passa
para a mãe, ou melhor, para toda sua vida. Fig quer ser Jolene, ter seu marido, seus
amigos, sua rotina, ser uma versão melhorada dela.
“(...) Os olhos de uma pessoa podem atrair ou repelir a gente. (...) “Você já viu um psicopata se apaixonar? Há um bocado de idealismo, emoções inebriantes, e eles enxergam o que querem ver.””
Obsessão,
carência, deboche são apenas algumas das características que rondam nossa
protagonista. Existe algo sobre ela que enoja, enfurece e atormenta, mas também
consegue nos arrancar risadas e até mesmo sentimento de empatia, pena. E dou os
créditos dessa contradição e complexidade para a própria autora, que opta por
não apresentar “mocinhos ou vítimas”, temos vilões, naturezas humanas deturpadas,
comportamentos que aparentemente assustam, mas que soam em outros como normal,
fazendo com que a realidade se mescle com a ficção, criando esse cenário onde o
antagonista pode ser seu vizinho, amigo, ou porque não companheiro. Temos
também uma humanização, pontos na narrativa que serve para emocionar,
sensibilizar e aproximar o leitor do narrador da história, mas lembra o que
falei lá no início? Ninguém é confiável de verdade.
ALERTA – PODE CONTER SPOILERS (mínimos, mas ainda assim que
possam te irritar ou atrapalhar no decorrer da leitura, caso você seja um
spoilerfóbico). Ao final farei uma conclusão, portanto pode pular para lá.
Hoje
como já devem ter notado, comecei a resenha de maneira diferente, pois optei
por focar mais na minha experiencia de leitura, do que no enredo em si,
justamente para não ficar soltando spoilers gratuitamente. Mas existe dentro de
mim, um grito que precisa ser solto, por essa razão coloquei o aviso de
spoiler, pois daqui pra frente, pretende dar uma aprofundada em alguns pontos.
O
que é a figura do primeiro narrador – A PISICOPATA?! Durante uma boa parte ali
do início me sensibilizei com alguns de seus pensamentos, não conseguindo enxerga-la
como vilã. Fig é dissimulada, carente, debochada, inteligente, sempre olhando,
ou tentando nos fazer enxergar por seus olhos, distorcendo as situações e conversas,
para justificar, ou dar ênfase naquilo que ela quer. Ela muda de opinião
conforme seus próprios interesses. E pelo menos pra mim, isso funcionou, porque
não sabia se a odiava, ou se simplesmente ficava Ok em relação a ela. Não que
eu aceite seu comportamento, ou justifique sua loucura, estou apenas tentando
dizer, que em alguns momentos ela se tornou mais humana e menos maluca aos meus
olhos.
E
então, chega a segunda narração e outro choque – O SOCIOPATA. Senhor... Darius
se revelando narcisista, vivendo de mentiras, obcecado por problemas e loucuras,
ocultando uma parte importante de sua personalidade. Não sei nem o que pensar,
foi aterrorizante imaginar alguém tão doente, tratando de pessoas com problemas
emocionais.
E
por fim – A AUTORA. Jolene... Confesso que durante boa parte da narrativa tive
vontade de sacudi-la, ninguém deveria ser tão complacente, altruísta, como se
mesmo com todas as evidencias não fosse capaz de enxergar o que estava
acontecendo bem diante de seus olhos. E quando ela começa sua narração
entendemos que ela não era assim tão indiferente, se mostrando mais sóbria e ciente
do que a rodeava. Mas por tudo que acompanhei ao longo de cada página, preferi
não a rotular como sendo a mocinha.
- FIM DO SPOILER -
Chocada,
acho que é assim que concluo a leitura e minha resenha. STALKER é uma leitura no mínimo perturbadora, me deixou um pouco
paranoica por uns dias. Em um mundo onde as redes-sociais têm reinado, e as
pessoas já não conversam mais tanto, ou se conhecem de verdade, é difícil não
se sentir com um pé atrás. Existe tanta inveja, frustração, descontentamento,
interesse por aquilo que se julga perfeito, que acaba aproximando essa ideia de
stalkear e desejar aquilo que não se tem.
“(...) Quando a gente vive no interior da própria cabeça o tempo todo, as coisas se distorcem. Você tem que expressar seus pensamentos pra se conscientizar de que não é a única que está ferrada. E constatar isso faz uma diferença enorme.”
Apesar
de ter gostado bastante da leitura e da escrita da autora, também preciso confessar
que senti falta de alguns detalhes, pra mim teve uma troca de foco no que a
história propunha, que é o interesse pela menininha e ser mãe, pela vida da
Jolene como um todo. O final também julguei um pouco rápido e inconclusivo, me
passando a ideia de que um circulo vicioso iria iniciar, uma espécie de caça
incessante. Mas, nada que tire o valor da obra e que tem potencial para agradar
muita gente. Outro ponto que ainda quero mencionar, é que se trata de uma
leitura rápida, com uma escrita envolvente e crescente, ou seja, o livro pode
até começar meio morno e linear, mas vai ganhando força com o passar dos
capítulos.
Enfim,
se vocês gostam de leituras que tirem da zona de conforto, que fale sobre naturezas
humanas deturpadas, distúrbios comportamentais, essa é uma ótima dica, pois de
modo geral me surpreendeu, sim.
Parabéns
a Faro Editorial, que já dispensa qualquer comentário sobre suas edições. A
qualidade e o carinho dedicado a cada obra são inquestionáveis.
STALKER - Tarryn Fisher
Sinopse: Ela não quer ser igual a você. Ela quer a sua vida. Quando Fig Coxbury compra uma casa na West Barrett Street, sua maior motivação não é o amor pelo bairro, ou ter se apaixonado pelo imóvel. É para ficar mais próxima de tudo o que ela deseja: o marido, a criança e a vida que pertence a outra pessoa. Com os olhos fixos na família Avery, Fig se insere gradualmente na rotina de Jolene, Darius e sua filha, Mercy. E não para por aí... Fig invade a privacidade familiar, e logo acredita que pode assumir, definitivamente, o lugar de Jolene. Ela persegue. Copia. Manipula. Cobiça. Usa táticas e cenas a cada momento. Toda stalker tem um objetivo. Para Fig, nada deve ficar em seu caminho.
Ficha técnica:
Thriller | Faro Editorial
| 2018 | 1º Edição | 256 Páginas | Cortesia | Classificação: 4/5 | Onde encontrar: SKOOB – AMAZON - SUBMARINO - AMERICANAS
Até
a próxima! Bye.
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